quinta-feira, 25 de abril de 2013

Julgando o meu primeiro julgamento

No sábado eu fui escalada para cobrir o meu primeiro julgamento.
E apesar de já ter quinze anos de profissão esta foi a primeira vez que vi o embate entre promotoria e defesa ao vivo.

Após a experiência posso dizer com todas as letras: É FASCINANTE!

O clima era de seriedade mas logo no início a enrolação do promotor, que gastou quase dez minutos agradecendo o juiz, o escrivão, a faxineira, os jurados, me levou a rir respeitosamente.

Estes, por sua vez, eram um grupo de jovens. Duvido que qualquer um deles tenha sequer a minha idade (33), e a jurada mulher me parecia ter 16 anos, mas como é necessário ter mais de 21 para ocupar uma cadeira no júri, imagino que ela tenha a idade mínima.

A juventude me preocupou porque achei inconsequente deixar nas mãos de pessoas com tão pouca experiência de vida, o resto da vida de outras pessoas.

Vinte e seis homens acusados pelo chamado "Massacre do Carandiru" estavam sentados do lado direito do juiz, à minha esquerda.  Olhei para a maioria deles e me impressionei ao ver tantos senhores de cabelos brancos e rostos aparentemente incrédulos. Alguns aparentavam deboche, outros desconforto.
Imaginei que algum deles diria: Maldito dia em que pisei no Carandiru.

Cheguei a ter pena, mas como Rui Barbosa bem lembrou, "os canalhas também envelhecem".

Eles aguardaram 20 anos para este julgamento e durante 3 horas de apresentação da promotoria, ficaram estáticos em seus lugares.
Eu, por outro lado, me mexia desconfortável na poltrona, tentando ouvir o que o promotor Fernando Pereira da Silva dizia. Ele parecia uma pastor dando um sermão para os fiéis. Horas elevava a voz e era energético. Outras vezes sussurrava tão baixo que todos os colegas jornalistas se inclinavam levemente para tentar compreender o que era dito.

A própria advogada de defesa mudou de lugar. Saiu do seu posto ao lado dos réus para ocupar uma poltrona no meio da platéia em frente.

Mas a mágica estava na lábia do promotor. Laudos com trajetórias das balas... Números contundentes... Comparações históricas... Quando acabou, eu tive pena da Dra. Ieda Ribeiro de Souza. Como ela iria rebater tudo aquilo? Provas incontestáveis...

Foi neste momento que resolvi não ir embora, mesmo com a chegada do meu colega Sandro Barboza ao tribunal. Liguei para a minha família e avisei que não sairia do Fórum da Barra Funda até ver o argumento da defesa.

Não me arrependi da decisão.

Após mais uma sessão de agradecimentos desnecessários, o clima começou a esquentar. Enquanto o promotor pintou o grupo como um coletivo de irresponsáveis, a defesa focou nos indivíduos. Pais de família, condecorados, batalhadores. Defensores dos cidadãos que foram colocados em um ambiente hostil, em um momento onde a PM não tinha equipamentos adequados e não podia se responsabilizar por alterações nas cenas dos crimes porque entrou, agiu e saiu. Ponto.

A Dra. era enfática. Energética. Passional.

No primeiro round do dia achávamos que não tinha volta e que não haveria réplica ou tréplica. Mas como ela causou feridas na acusação, o julgamento ficou ainda mais longo.

Para a minha frustração, não pude continuar acompanhando este jogo de xadrez, de pinceladas em brechas legais, de mocinhos e bandidos ao contrário.

Deixei o fórum curiosa e vibrando com a perspicácia desses advogados que só pela quantidade de papéis nas mesas, devotaram muito tempo para entender um dos dias mais marcantes da história criminal do País.

Soube pelo Sandro que a briga continuou boa depois que saí, mas que o outro promotor, Márcio Friggi, foi ainda mais competente e carismático, ganhando os jurados e conseguindo a condenação dos réus.

Seja como for, a experiência jornalística foi inesquecível e me fez ter mais respeito pelo processo jurídico.
Cheio de falhas, de enrolações, de homenagens sem propósito. Mas com muito estudo, paixão, envolvimento, jogo de cintura e coragem. Sendo essa a principal característica que vi nas oito horas de julgamento que presenciei.

Um comentário:

  1. Realmente, sempre gostei de filmes sobre julgamento, tribunais, etc......acho que por realmente ter horror a injustiças. Acho que está no DNA, pois sua avó também adora. Bem, ao vivo, pude perceber que é ainda mais fascinante. Quanto aos Doutores advogados eu não sei, mas como jornalista, cada vez você me deixa mais orgulhosa!!!

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